
Psicóloga do Colégio Apoio destaca a necessidade do brincar livre, do convívio com outras crianças e da valorização do ócio para combater a adultização
Em tempos de conectividade constante e exposição desenfreada ao mundo adulto, a infância tem se encurtado. A Declaração Universal dos Direitos da Criança, da Organização das Nações Unidas (ONU), de 1959, reconhece o brincar como um direito essencial ao desenvolvimento infantil e ferramenta de proteção à infância, fortalecida pela Convenção dos Direitos da Criança de 1989 e garantido, ainda, pela Constituição Brasileira e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.
No entanto, a pressão por desempenho e o uso excessivo de dispositivos eletrônicos com conteúdos inapropriados para a idade estão afastando as crianças da vivência plena dessa fase da vida.
“A infância contemporânea está perdendo a diversidade de experiências que ajudam no desenvolvimento de habilidades emocionais, sociais e motoras das crianças. O brincar livre não é apenas entretenimento, mas a forma como a criança se expressa, cria, aprende a resolver conflitos e a interagir socialmente. Ele é vital para o desenvolvimento integral. Hoje, a infância tem sido muito menos baseada no brincar livre e mais baseada no uso excessivo de telas e eletrônicos”, destaca a especialista Rafaella Cursino, do Colégio Apoio do Recife, que é doutora em Psicologia Clínica pela Universidade Católica de Pernambuco – UNICAP.
Outro fator que merece atenção é a hipercompetitividade imposta às crianças. Com agendas lotadas de atividades e pouco tempo para o ócio e o brincar livre, elas acabam desenvolvendo cansaço, irritabilidade, além de distúrbios no sono e na alimentação.
“Vivemos em uma sociedade focada na performance e as agendas das crianças têm sido cada vez mais cheias de atividades extras, o que repercute no pouco tempo para brincar, para viver o ócio e a vida de forma mais desacelerada. É preciso olhar para a singularidade de cada criança e entender os seus limites para preservar o seu bem-estar. É importante formarmos adultos competentes, mas socialmente hábeis, flexíveis e sensíveis ao outro”, destaca Rafaella Cursino.
A exposição precoce a conteúdos inadequados, como a pornografia, também é uma das questões mais preocupantes, em meio ao consumo excessivo de telas.
“A internet oferece um acesso ilimitado ao mundo adulto, e as crianças estão vivenciando situações não adequadas para a idade. Antes existiam os ritos de passagem. As crianças e pré-adolescentes tinham classificação do que podiam acompanhar em cada idade. Com a inserção nesse mundo online podem acessar tudo o que quiserem e a hora que quiserem,” alerta a especialista.
O desafio é encontrar o equilíbrio entre o uso da tecnologia e o tempo da infância, proporcionando espaços para brincadeiras ao ar livre, convívio com outras crianças e a valorização do tempo ocioso.
“A natureza e o brincar coletivo permitem à criança desenvolver-se plenamente, com confiança e criatividade. Precisamos garantir que essa liberdade não seja sufocada pela pressa de moldá-las para o futuro ou pelo descontrole no acompanhamento do tipo de conteúdo que estão consumindo. Preservar a infância é um ato de responsabilidade com o bem-estar emocional e psicológico das crianças, que precisam de tempo e espaço para serem crianças antes de qualquer outra coisa”, destaca a psicóloga Rafaella Cursino, do Colégio Apoio do Recife.