
Por Rafael Vaisman, biólogo e mestre em Inovação, Cultura e Sustentabilidade
Hoje é 05 de junho, Dia Mundial do Meio Ambiente. E escrevo este texto não apenas como biólogo ou empreendedor da sustentabilidade, mas como um ser humano que sente — cada vez mais — a urgência de reconectar nossa espécie à própria casa.
A data foi instituída pela ONU em 1972, durante a Conferência de Estocolmo, quando pela primeira vez o mundo se reuniu oficialmente para debater a relação entre desenvolvimento e meio ambiente. Ou seja, há mais de 50 anos, o planeta nos pede atenção. Mas será que estamos ouvindo?
Vivemos em 2025 cercados de tecnologias capazes de prever o tempo, traçar rotas, criar imagens com um clique e redigir textos com inteligência artificial. Mas talvez estejamos perdendo o essencial: a capacidade de sentir e pensar o planeta como parte de nós — e não como algo externo
“A verdadeira medida de uma civilização está na forma como ela trata os seus ecossistemas.”
— David Orr, educador ambiental e filósofo da sustentabilidade
Há cerca de 300 mil anos, o Homo sapiens emergiu na África. Desde então, percorremos um caminho extraordinário: aprendemos a controlar o fogo (há 100 mil anos), a praticar agricultura (há 10 mil), a construir cidades (há 5 mil), e agora, em um piscar de tempo, criamos inteligências artificiais capazes de nos superar em velocidade, memória e cálculo.
Mas ao mesmo tempo, estamos perdendo nossa inteligência mais ancestral: a inteligência ecológica. Segundo o Living Planet Report 2022, a Terra já perdeu 69% das populações de animais silvestres desde 1970. Em 50 anos, diluímos o que levou milhões de anos para evoluir.
Será que, ao desenvolver máquinas pensantes, estamos nos tornando seres menos conscientes Nietzsche dizia: “O deserto cresce, e ai daquele que guarda desertos em si.” Talvez estejamos externalizando nossos vazios interiores no mundo natural, degradando florestas como quem suprime a própria sensibilidade.
Hoje, com mais dados do que nunca, ignoramos os mais básicos:
- Em 2024, ultrapassamos 424 ppm de CO₂ na atmosfera — o maior nível em mais de 3 milhões de anos.
- Já cruzamos 6 dos 9 limites planetários, segundo o Stockholm Resilience Centre.
- Estima-se que precisaremos de 1,7 planetas Terra para sustentar nosso padrão de consumo atual (Global Footprint Network).
E mesmo assim, continuamos tratando o meio ambiente como se fosse um “outro” lugar. Mas ambiente é onde tudo acontece — é corpo, é cultura, é chão e é ar. É meio em todas as dimensões: físico, social, biológico, emocional.
“Nós não herdamos a Terra de nossos antepassados. Nós a tomamos emprestada de nossos filhos.”
— Provérbio nativo norte-americano
Na era da automação total, talvez ganhemos tempo. Mas o que faremos com esse tempo? Ocupar ou regenerar? Viver ou consumir?
É urgente reconectar a inteligência da mente com a sabedoria da Terra. Como Platão propunha, o conhecimento verdadeiro não está nas sombras das aparências, mas na luz da consciência. A consciência de que meio ambiente é meio humano. O planeta não precisa ser salvo — quem precisa de salvação somos nós.
A tecnologia pode ser ferramenta de cura, mas apenas se servirmos à vida e não ao lucro. Isso exige mais do que inovação: exige sabedoria. Uma sabedoria regenerativa, que seja capaz de ver o mundo não como recurso, mas como relacionamento.
“Tudo está interligado como o sangue que une uma família.” — Carta do Chefe Seattle, 1854
Ainda dá tempo. Mas o tempo — esse bem cada vez mais artificial — não é infinito.
E talvez a verdadeira inteligência seja aquela que aprende a conviver, não apenas a calcular.